Estabilidade: aprofundando alguns conceitos básicos

Quando o assunto é vela, estabilidade é um conceito muito utilizado. A noção mais comum é de que estabilidade nunca é demais. Quanto mais estabilidade, melhor. Será? Os veleiros mais marinheiros são os mais estáveis? Um catamarã é mais estável do que um monocasco? O que é estabilidade, afinal?

Estabilidade (vamos falar aqui de estabilidade transversal) é a tendência que um casco tem de se manter na posição vertical ou de retornar a ela quando alguma força produz um adernamento do casco. Em veleiros, a questão da estabilidade é crítica porque o vento, atuando sobre as velas, quase sempre produz um momento que tende a virar a embarcação. Se esta força for superior a capacidade do casco de resistir ao rolamento, o barco vira. Velejadores de monotipos como o Laser conhecem bem a situação.

Existem duas maneiras de se oferecer estabilidade a um casco. A primeira é pela forma dele. Um casco largo, ao adernar, desloca seu centro de carena ( a resultante da força de empuxo) para o lado onde aderna. Isto cria um torque no sentido contrário ao adernamento, já que o centro de gravidade continua atuando próximo ao centro da embarcação. Quanto mais largo o casco, maior a estabilidade de desenho. Catamarans na prática são equivalentes a  monocascos extremamente largos.

A segunda maneira de dar estabilidade é por lastro. Lastro é um peso elevado e concentrado na parte mais baixa do casco, ou fora dele, numa quilha. Quando o barco começa a adernar, a força de restituição do lastro é mínima, já que ele praticamente não se desloca em relação ao centro de gravidade. Porém, quanto mais o casco se aproxima de um ângulo de 90 graus, maior o efeito do lastro na restituição do casco.

Veleiros em geral se valem das duas formas para atingirem os objetivos de estabilidade do projeto. O quanto de cada uma depende do objetivo do projeto. Muita estabilidade de desenho permite diminuir ou eliminar o lastro, e obter cascos de planeio rápidos e leves, com menor necessidade de estruturas e portanto mais baratos. Muito lastro dá a embarcação muita estabilidade em elevados ângulos de adernamento, permitindo até a rápida restituição após uma capotagem, antes que água inunde a cabine e afunde o barco. Cascos com muita estabilidade de desenho adernam pouco mesmo sob ventos fortes, mas são tão estáveis em pé quanto de cabeça para baixo. Também copiam toda a forma das ondas, ou seja, em mar agitado são desconfortáveis. Cascos com muita estabilidade de lastro adernam bastante no início do adernamento, ou seja, velejam sempre adernados, mesmo sob ventos fracos. Assim, combina-se as duas técnicas para se chegar a um casco eficiente e confortável, seguro e leve. Tudo depende de para que o barco foi projetado.

Isso é um resumo bem superficial da questão. Outro lado da estabilidade é a estabilidade dinâmica, que tem a ver com a velocidade com que o barco se move lateralmente quando navegando. Estamos falando de momento de inércia. Em termos de estabilidade estática, um mastro leve baixa o centro de gravidade e deixa o barco mais estável. Em termos de estabilidade dinâmica, um mastro pesado aumenta o momento circular de inércia e deixa o barco mais estável. Qual o ideal? Novamente, depende dos objetivos do projeto. Se você é atingido por uma onda quebrando pelo través, você quer estar num barco com pouca estabilidade inicial (para não adernar com a onda), muito lastro (para manter o barco em pé), e muito momento de inércia (para frear o rolamento). Veleiros projetados para travessias oceânicas tem boca menor em relação ao comprimento, maior deslocamento, muito lastro, e armação reforçada, com um plano vélico baixo, uma quilha longa para frear o rolamento. Em geral. Porque os Skerry Cruiser são famosos por suas qualidades de velejar sob condições ruins sendo leves, com mastreação alta, e quilhas pequenas. Mas tem muito lastro e são muito estreitos em relação ao comprimento.